domingo, 28 de dezembro de 2008

O medo de existir + a não-inscrição



Após o episódio da pistola na Escola do Cerco, parece que finalmente se começou a falar do principal problema da educação, que tem andado a ser escamoteado:

“E é preciso ter a noção que muito casos são abafados pelas escolas, que tentam apresentar números de sucesso e preferem não atacar os problemas de frente”, conta uma outra fonte policial contactada pelo DN. “Muitas das situações são relatadas às autoridades apenas por interposta pessoa, ou então quando surgem na internet ou na comunicação social, o que torna muito difícil o nosso trabalho”, continua». (Diário de Notícias, 27-12-2008)

«Há que ser sincero e realista: não são nada esporádicos os casos em que as estatísticas da violência e indisciplina em meio escolar são abafadas logo na origem, porque existem órgãos de gestão que não gostam de entrar na lista negra dos organismos regionais e centrais do ME. Quantas vezes há participações disciplinares que acabam por não ser feitas, quantos processos acabam por ser arquivados, quantas ocorrências desocorrem apenas porque há avisos e conselhos do género, olha-lá-que-é-capaz-de-ser-pior-para-ti-e-para-todos… ou não-queres-que-se-saiba-isso-pois-não?» (Paulo Guinote)

«Neste momento há um factor a acrescentar. As escolas têm medo de perder a alunos se os casos forem tornados públicos. E nisto colaboram or orgãos de gestão e alguns professores.Não percebem que estão a atirar o lixo para debaixo do tapete. Uma qualquer oclusão cerebral cria-lhes a ilusão que nada se saberá. Obviamente que estão enganados. Tudo se sabe, e os pais retirarão os filhos dessas escolas, exactamente por nada ter sido feito. A atitude tomada com o objectivo de não perder alunos fará perder muitos mais». (comentário)

«O pessoal está a sair do armário!! A indisciplina está generalizada na escola! É verdade que os executivos tentam mistificar as coisas para não estragar a imagem! Na minha escola os CEFs são indescritiveis!» (comentário)

«Enquanto não nos levantarmos em força contra a guerra civil que se vive nas escolas… merecemos!» (comentário)

«Tal como demonstrado em vários estudos, se a falta de disciplina não for atacada cedo, tende a agravar-se e a generalizar-se por efeito de contágio.» (comentário)

«Os alunos sentem-se sempre inseguros ao denunciar este tipo de problemas. Está algo podre nas nossas escolas…E é já há algum tempo.» (comentário)

«Na minha escola vejo instalar-se, mês após mês, ano após ano, a lei da selva, a lei do mais forte. As cenas de pancadaria repetem-se, tornam-se rotina, com os responsáveis a gozar de toda a impunidade.» (comentário)

«Achei o filme “A Turma” muito soft, nós temos material para um filme daqueles com muito mais acção.» (comentário)

«O filme é soft. Quem fica impressionado com aquilo não faz ideia de muito do que passa por aí.» (Paulo Guinote)

«Dito de outra forma, maus mesmo são os telemóveis que "filmam". Se os proibirem nas aulas, acabam magicamente os "problemas". O que não se vê, não existe.» (Portugal dos pequeninos)

«O que parece preocupar as autoridades escolares não são os episódios desta natureza mas sim a sua divulgação. Se não forem divulgados, não existem. A escola pública está num estádio de negação da realiadade. A avaliação dos professores é a fingir; a avaliação dos alunos caminha para tal; a indisciplina e a violência sobre professores, funcionários e alunos só existe quando é filmada.» (Ramiro Marques)

«Todos sabemos que a maior parte das ocorrências não são relatadas. Os professores ouvem todo o tipo de insultos e de ameaças dentro das salas de aulas e raras vezes participam das ocorrências. Porquê? Toda a gente sabe que um professor que participe de uma ocorrência dessas é um docente marcado. Com a ameaça da avaliação burocrática de desempenho, isso pode significar um irregular. Certamente, o impedirá de ter acesso a um Muito Bom.» (Ramiro Marques)

E José Gil sobre a não-inscrição: « -A não-inscrição neste caso é o Governo ignorar isso tudo? - Totalmente. É um exemplo típico de não-inscrição. Totalmente. Não só não-inscrição. Há pior do que isso.» (Correio da Manhã, 28-12-2008)

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Feliz Natal

*

«Aluno de 15 anos espanca auxiliar

Uma auxiliar de acção educativa da EB 2,3 de Paços de Brandão, Santa Maria da Feira, foi espancada a murro e a pontapé por um aluno, de 15 anos, na portaria do estabelecimento de ensino. Foi a segunda vez que Fátima Almeida, de 51 anos, foi agredida. Mas, mesmo assim, prefere o silêncio para não arriscar um processo disciplinar. (...) O aluno continua a frequentar a escola, o que revolta os auxiliares da mesma, que dizem ter medo de serem também agredidos. Actualmente, entre os alunos o agressor é visto como um herói, o que faz aumentar a revolta dos funcionários e também de encarregados de educação. »

in Correio da Manhã, 22-12-2008

* Foto: este também foi espancado, na minha escola.

sábado, 20 de dezembro de 2008

Sábado



Para não terem que trabalhar no dia 24 de Dezembro, os professores optaram por ter reuniões de avaliação neste sábado.

«A professora da disciplina [...] justifica o elevado número de níveis inferiores a três pela falta de empenho, interesse e responsabilidade, aliado a uma enorme carência de hábitos de estudo e trabalho, assim como uma fraca ambição de perspectivas futuras. É de notar também a falta de atitude cívica e social assim como a dispersão perante as matérias leccionadas. Perante isto, a fraca capacidade de compreensão e expressão mostra-se natural como consequência. Por fim, os objectivos dos alunos situam-se sempre fora do âmbito escolar, levando também a que o seu comportamento se mostre perturbador e influenciador de níveis negativos». Fim de citação.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Avaliações (2)



Dia de reuniões. Na "minha" turma de 7º ano, metade dos professores dão mais de 50% de níveis negativos e apresentam a devida justificação por escrito. As causas são: desinteresse, recusa em trabalhar, má preparação, competências não desenvolvidas, indisciplina, faltas repetidas, etc. Destes 24 alunos, 15 serão sujeitos a "planos de recuperação" no próximo período, o que significa apoios extra a alguns (sujeito às disponibilidades para apoios educativos nos horários dos professores) e medidas de apoio dentro da sala de aula, além do necessário acompanhamento em casa pelos pais. Ou seja, mais de metade da turma, a que não quer aprender, será considerada como estando em regime de recuperação nas mesmas aulas onde não querem estar.

Pressenti - e percebi - que os professores estão fartos da palhaçada da avaliação e não estão já dispostos a participar na fraude estatística do sucesso educativo. As notas espelham uma realidade incontornável. Não é possível trabalhar nestas condições. Pois o ministério reduziu os meios necessários para horas de apoio individualizado e para serviços especializados de apoio psicológico. Em acta de conselho de turma ficou escrito que só se conseguiria trabalhar com turmas com metade dos alunos, como acontece em algumas disciplinas científicas e artísticas. Ou com o regime de co-docência: dois professores na aula.

Mas a opinião pública continua a pensar ou a fazer crer que os protestos dos professores se devem apenas aos trâmites da sua própria avaliação. A razão por que 75% se pudesse deixaria esta profissão é por tudo o mais que nos inferniza a vida: o desrespeito geral, a indisciplina, a falta de condições e a burocracia que nos retira tempo para trabalhar para os alunos. Por isso, a palavra de ordem mais usada tem sido: "Deixem-nos ser professores". Parece que ninguém entende ou não quer ouvir este apelo, que é de desespero.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

A lei da selva



Último dia de aulas. Os alunos organizaram uma festa, com muitas sandes e bolos caseiros. Às cinco da tarde começa a música a bombar. Os professores que iam dar as aulas do fim do dia dizem: «Mas como é que se pode dar aula com este barulho todo?» Deixam os alunos sair. E subitamente - neste território onde não é habitualmente permitido os alunos andarem pelos corredores - juntam-se centenas de miúdos excitadíssimos e em correrias por todo o lado. No exterior, começa a porrada. Professores e auxiliares metem-se à confusão. Já há miúdas a chorar e rapazes aleijados. A multidão junta-se em grande agitação. Um pai - o pai do miúdo mau - já quer bater não sei em quem e já o agarram furioso. Vem a direcção e levam-nos para cima.

Eu volto à zona da festa, a ver como as coisas estão. Nenhum adulto à vista. Explode um projector de luz. A música é logo retomada. De seguida, dois miudinhos começam a fazer esguicho do bebebouro apontando ao outro projector. Vejo aquilo e consigo agarrar um que puxo pela manga do casaco até ao Conselho Executivo, enquanto ele se debate agressivamente. Chego lá acima e - qual milagre - a polícia já lá está. O agente fala com o miúdo que, depois de muitos protestos, se acalma e senta. O polícia vai falando: «Tu portas-te assim com uma professora? Tu falas assim comigo que sou polícia? Tu não deves estar bom da cabeça». O miúdo tem uns 11 anos. Depois de muito apertado lá diz como se chama e de turma do 5º ano é. De repente chega um rapaz de uns 16 anos e bate no ombro do polícia que está agachado a falar com o puto. «O que que passa? Este é o meu irmão». O polícia levanta-se devagar, cresce diante do graúdo: «O senhor espere que já falo consigo». Impassível e ameaçador, o outro exige: «Quero saber o que é que fizeram ao meu irmão». «Espere que já falo consigo». Conclui a conversa com o miúdo e vai falar com outro, que nem o respeita nem o teme, nem se demove. Se é assim que tratam os polícias, como não tratarão os professores... Nunca visto.

Afasto-me. Uma colega diz-me: «Cuidado, Leonor, ao descer, que andavam a dizer que tinha batido no miúdo». Saio com algum receio. Enfrento com o olhar o outro miúdo que antes fez explodir o projector. São 18 horas, lá fora já está escuro e a miudagem anda agitada. Mal se vêem, mas ouvem-se bem, crianças frenéticas a correr atrás dos arbustos e dos carros. Como o jardim está mal iluminado, penso.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Avaliações e avaliação



Enquanto os alunos e pais ajustam contas particulares, os professores embrenham-se no rol das avaliações dos seus pupilos. Não se lhes pode comunicar as notas antecipadamente, pois as decisões finais serão dos Conselhos de Turma. As DTês inserem faltas e classificações no sistema informático, arruma-se a papelada, preparam-se os relatórios dos apoios dados, das provas de recuperação, da justificações dos níveis de insucesso, etc.

Mas os professores - que são e sempre foram os especialistas da avaliação dos conhecimentos, das aprendizagens e das competências - agora não aceitam ser avaliados por um sistema absurdo, injusto e inexequível. Um modelo tecnocrático que - só este ano e com este simplex - promete dar um Bom e assegurar a progressão na carreira a quem executar simplesmente a parte administrativa do seu trabalho. A avaliação das competências pedagógicas, essas sim, as principais, só serão exigíveis a quem quiser ter nota de Muito Bom ou Excelente.

E se a ministra, por via do simplex de última hora, deixou cair (mas só este ano) a avaliação dos professores em função dos resultados dos seus avaliados - outros pedagólogos continuam a defender que os professores têm que ser avaliados pelas notas dos alunos. Quem fala assim não conhece a escola, nem sabe o que é ensinar. Não sabe nem pode avaliar...

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

A não-inscrição



Afinal, venho a saber, por outra mãe que hoje marcou encontro comigo, que a mãe da outra menina há já um mês que ameaçou bater na filha desta, enquanto a outra filha andava a alvejar a "amiga" com sms insultuosos... «Há um mês? E não me disseram nada?», pergunto incrédula. «Disse à minha filha que não a incomodasse com isso, que já deve ter muito trabalho». Então é por isso que as miúdas não prestam atenção nas aulas, concluo.

E na semana passada a outra bateu na filha desta que chegou a casa a coxear com o pé inchado e com "negras". As filhas e as mães não acreditam já na autoridade escolar e ajustam contas por meios próprios. É que, explica-me esta mãe, a filha no ano passado já foi ameaçada com uma pistola - e o conselho executivo nada fez, diz-me ela, diante da minha estupefacção crescente. Mas nada se sabe nem se conta. As pessoas preferem não se queixar. Calam, ruminam, maldizem e agem individualmente para sobreviver. É esta novela que os jovens aprendem na escola.

Entretanto, diante das participações dos DT, ouço um colega dizer que não adianta suspender os alunos, porque daí a dias voltam para a escola e fazem o mesmo... Eu nem queria acreditar no que estava a ouvir. A suspensão de um aluno desordeiro é imprescindível para dar exemplo aos demais, para actuar com justiça e para repôr a calma na turma durante aqueles dias. O contrário é instituir a lei da selva.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O estado das coisas



A infeliz morte violenta acontecida na Casa Pia, na sexta-feira passada, é só a face mais visível do fenómeno de intimidação que governa o outro lado das escolas, sob o olhar incauto ou complacente dos professores. Acabava de perceber isso, quando soube a notícia. Na minha escola, também houve uma facada, mas acertou só no ombro... Aqui ainda não há gangs, comentava eu com uma colega que logo, baixando a voz, me diz: "Ai, há, há..." (E por que baixam a voz quando se fala dos problemas que se deviam dizer bem alto? Porquê o medo? Porquê o tabu?)

Hoje à tarde recebi uma mãe que me diz sem peias que pelas grades da escola se vende droga a miúdos de 10 anos e à vista de todos. Isto enquanto admoestava o filho: "Não te quero ver com esses miúdos". Fiquei estupefacta. Lembrei-me de uma professora na Musgueira que conheci na manifestação de 8 de Novembro e que me contou que via os alunos a passar droga nas aulas e nada podia fazer, com medo de retaliações dos papás, pois.

Assim percebo por que não é possível sequer prender a atenção ou o interesse dos miúdos nas aulas. Andam aflitos com outros problemas. Isto já não se chama escola.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

O medo de existir (3)



Hoje, na Assembleia de Turma semanal, voltei ao assunto da "tourada" e reafirmei claramente:
1 - Ninguém pode bater em ninguém, nem perseguir, nem ameaçar, nem chatear; isso é bullying.
2 - Quem for agredido ou ameaçado tem que participar: a mim, em primeiro lugar, pois estou aqui para vos ajudar;
3- ou a um professor ou funcionário, ou ao conselho executivo; e se alguém vos agredir, podem chamar a polícia, ligam o 112.

De seguida, começaram a chover as queixas: que há miúdos que são mais importantes que outros porque são mais fortes e batem; que eles não podem contar porque os outros ameçam bater mais; que há miúdos que levam sempre, mesmo que não façam nada. Só não fiquei a saber quem bate em quem, pois tiveram o pudor de não os expôr. É isso que tenho que perceber nos próximos dias.

Caí em mim: eu não supunha, nunca tinha imaginado, não adivinhava pelas lutas de corredor - que estes miúdos pudessem viver num tal clima de intimidação física.

Ao sair da escola, dois polícias da Escola Segura tentavam acalmar um miúdo de 10 anos: «Se o fulano te ameaçar, telefonas-me, ouviste?», insistia o agente. O miúdo, cheio de baba, ranho e raiva, jurava que o outro havia de levar com uma pedrada, que não se ficava a rir. O polícia insistia: «Não faças nada, que depois é pior para ti».

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O medo de existir (2)



Desde que na semana passada debatemos - na aula de Formação Cívica - a questão da violência escolar, e eu afirmei peremptoriamente aos meus alunos - "estou aqui para vos ajudar, e todos os problemas que tiverem devem contar-me, ou devem participar, porque se não o fizerem é que nada se pode resolver" - desde esse dia começaram a chover pequenas queixas: aquele bateu, aquele roubou, aquele ameaçou...

Quando hoje levei, de novo para a aula de Formação Cívica, um texto sobre "bullying", já estava a ser ultrapassada pela realidade. Uma miúda refugiava-se no posto médico, depois de levar com um projéctil de uma colega no olho. Estava com medo de ir para a aula e sentei-a na minha mesa. Falaram vários, entre berros e chamadas de ordem (e nem houve tempo de ler o texto).

Uma miúda decidiu interpelar-me: «Ó setora, diga-me só: se lhe batessem, o que é que fazia?» Nunca me tinham feito tal pergunta, mas respondi: «Tentava fugir e pedir ajuda, fazia queixa». «A setora ficava-se?!» Percebi que ela também nunca tinha ouvido tal resposta. Fomos ambas surpreendidas uma pela outra. Na "ética" destes miúdos, uma pessoa que não dá troco quando "leva" não tem... valor, força, prestígio? Não sei, não entendi bem...

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

O medo de existir



Uns dias depois recebo o telefonema de uma encarregada de educação muito preocupada porque a sua criança de 12 anos anda doente, febril, com dores de cabeça, com medo - pois os alunos de secundário da professora cujo telemóvel foi roubado andam a pressionar, a ameaçar, a perseguir os mais pequenos e fracos. Obviamente, expliquei que essa atitude não podia ser sugestão da professora roubada, era coisa da iniciativa dos alunos mais velhos. Algo de incontrolado se passa que escapa ao conhecimento dos professores...

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Bola de neve (2)



Aqui há uns dias, o Conselho Executivo da minha escola decidiu (admitamos que com a melhor das intenções) avisar todas as turmas, através de um comunicado circular, de que "não se responsabilizava" por telemóveis e outros aparelhos roubados ou perdidos. Quiseram, suponho, pôr fim às queixas que lhes chegavam. Pois o efeito foi o inverso. Nesse acto de desresponsabilização, declararam perante todos os alunos: façam o que quiserem, a partir de agora podem roubar à vontade, que nós não queremos saber. Ora, saber o que se passa numa escola é a primeira obrigação de uma direcção. Se não podem resolver os casos, devem informar os lesados de que apresentem, como qualquer outro cidadão, queixa na polícia. Foi o que aconselhei à colega cujo telemóvel foi roubado nesse mesmo dia, logo após a ordem de demisssão da autoridade escolar.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Avaliação parada



O modelo de avaliação dos professores proposto pela plataforma sindical, que alguns jornais e comentadores ligeiros chamaram "auto-avaliação", é muito mais do que isso: começa, como não podia deixar de começar, pela auto-avaliação (que é um relatório da actividade desenvolvida por cada professor) e tem duas instâncias de avaliação superior. É um modelo perfeitamente equilibrado e justo.

Mas, dê por onde der, a avaliação está parada e pode ficar parada:
Como estoirar com a avaliação burocrática sem cometer ilegalidades?

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

"Capitão titular"


Ler a história no Anterozóide.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

A tourada



Chamam-lhe bullying, que vem de bull, touro. Chamemos-lhe tourada. É o que se passa na escola durante os intervalos. Miúdos e miúdas permanentemente ao pontapé, à porrada, ao insulto. Um professor aproxima-se, separa-os, tenta mediar a situação e dizem "é só brincadeira". Pois, e quando um deles bater num cunhal de porta e partir a cabeça, acaba-se a brincadeira.

Hoje um miúdo levou com uma pedrada na cabeça. Veio a ambulância para o levar ao hospital. Vinha a descer e pergunto o que tinha acontecido. "Foi ali aquele miúdo". "Foste tu?", perguntei. "Fui", respondeu orgulhoso. "Chamou nomes à minha mãe, levou". "Pois, mas antes era ele que era castigado, e agora vais ser tu". "Mas fica marcado".

Na aula de Formação Cívica que acabara de dar ao meu 7º ano, falou-se de violência escolar. As regateiras da turma defendiam os seus pontos de vista: «Esta escola é uma espelunca. Se eu pudesse ia para outra". Protestam, mas são as que armam mais problemas disciplinares. Só sabem resolver as coisas assim.

Opinião pública (2)



Uma notícia saída no Público serviu-me de base para um teste sobre a matéria de Texto Jornalístico no 7ºano. No final, pedia um comentário acerca das "actividades de enriquecimento curricular" e das "aulas de substituição":

«O que eu penso das aulas de substituição é que uma grande fantochada porque a maioria das vezes ficamos na sala a jogar ou a trabalhar. Em vez de virmos apanhar ar fresco ou correr para o jardim ou para o campo jogar futebol. Mas também há jogos muito bons de nível cultural e mental. E acho que também não aprendemos nada nas aulas de substituição. E que há muitos professores que não gostam de dar aulas de substituição.»

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Opinião pública


Sondagem online da RTP em http://ww1.rtp.pt/noticias/, às 14h30.

Greve

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Mudam-se os tempos



Creio que se terá compreendido abaixo - (1) e (2) - que a legislação que modificou o estatuto do aluno em 2008 pretende criar todo o tipo de obstáculos e mecanismos de retroacção que impeçam a retenção dos alunos no mesmo ano. Com beneficios estatísticos, já se vê.

Assim, se o aluno falta, faz-se-lhe uma prova de recuperação para limpar todas as anteriores faltas; se ele é desmotivado, desinteressado ou tem problemas de aprendizagem, o professor de cada disciplina tem a obrigação de o apoiar dentro e fora das aulas colectivas. Se não o assinalar atempadamente, então é porque o aluno não tem problemas, logo, deve passá-lo no final do ano; ou então os EE poderão recorrer da avaliação e invocar a falta de apoios. Como são muitos os alunos nesta situação, não há professores que lhes cheguem. Para mais, a maioria destes alunos despreza a escola e os professores e ninguém os fará aprender o que quer que seja, nem sequer obrigá-los a vir às aulas. Se vierem é para perturbar os que querem aprender. É tempo perdido numa causa perdida. Mas passar passam.

Quando fui aluna, tive professores exigentes. Quando me tornei professora fui sempre (considerada) exigente. E sou exigente comigo própria. O que podemos esperar desta novíssima geração educada no laxismo e na irresponsabilidade? A mediocridade, a ignorância... e que mais?

domingo, 30 de novembro de 2008

Debate sobre indisciplina e CEFs



1. 31 processos disciplinares numa semana. Como um grupo de delinquentes destrói o ambiente de uma escola

«A agressão a soco e pontapé de um aluno de 16 anos à professora de 50 anos, na escola 2/3 de Jovim, em Gondomar, foi, no entender da vítima, o "culminar" de um clima de grande tensão que se vive naquela estabelecimento de ensino. A docente alerta para o facto de, numa só semana, terem sido registados 31 processos disciplinares (...)».

«É evidente que a escola EB 2,3 de Jovim está refém de um grupo de delinquentes. Um grupo de delinquentes que não deviam estar na escola, mas sim num colégio de portas fechadas que os sujeitasse a um processo de reeducação que integrasse:
i. Acordar todos os dias às 7:00 com marcha na parada durante 30 minutos (...)».

Fonte da notícia: CM de 30/11/08

2. Um debate sobre os CEFs. Um tumor que corrói o ambiente das escolas ou um instrumento necessário para combater os males da sociedade?

«Querer resolver, dentro da escola, um problema que o estado não resolve, e devia, está a prejudicar aqueles que fazem da profissão docente aquilo que ela deve ser: formar uma geração devidamente habilitada para melhorar, no futuro, as condições de vida de todos.» (Ramiro Marques)

3. Anabela Magalhães faz a defesa dos CEFs

«Com o saber de experiência feito permito-me discordar quando o Ramiro afirma que "Os CEF`s são um tumor que corrói os tecidos sãos das escolas onde estão implantados." Alguns alunos dos CEF`s, pela minha experiência muito poucos, são um verdadeiro tumor, mas são casos verdadeiramente excepcionais dentro destas turmas. Poderei lá eu voltar à sala de aula na terça-feira e olhar para o meu M, o meu F, o meu C, o meu B... como tumores?! Jamais enquanto professora tomei esta atitude e não desisto de os trazer para mim, para a Escola, para a Educação, até se me esgotar o último fôlego! E não acho que com esta atitude faça nada mais do que a minha obrigação como professora». Anabela Magalhães

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

A má educação



Esta semana pegou a moda de roubar telemóveis. Uma professora em substituição foi roubada pela minha turma, "turma simpática até", disse-me ela. Depois, foi à sala um professor do Conselho Executivo e reteve os alunos na sala até os revistar todos. O telemóvel não apareceu.

No dia seguinte, os alunos estavam muito zangados por os terem feito sair mais tarde. Discutiram o assunto em Assembleia de Turma. Ao fim do dia recebi uma mãe que vinha protestar e exigir que o professor em causa pedisse desculpa à filha por a ter acusado. Lá lhe disse que a suspeita era geral, não pessoal. Responde-me: «Se os professores querem ser respeitados, têm que se dar ao respeito». Fiquei sem resposta, não estava à espera. Mandei-a tratar do assunto com o CE.

Com pais destes, como podem os filhos sair bem-educados?

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

A bola de neve



Quando começa a rolar ninguém a pára. Assim é com a indisciplina. Desde há três semanas pegou a moda de insultar as professoras. Mas, note-se, acontece sobretudo nas aulas de substituição, onde os alunos sabem que não são conhecidos - nenhum vínculo ou relação pessoal os liga àquele professor - e aproveitam para fazer as maiores tropelias que conseguem. E não se pode pará-los? Poderia, mas era preciso que os professores deixassem de se acobardar. «Isto já bateu no fundo», diz quem já ficou debaixo.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

O capricho



Estava na sala de professores, quando chega à porta uma menina da minha turma a chamar-me. Vem queixar-se da professora de matemática. Conta-me que estava a falar muito e a professora a mandou calar várias vezes, até que começou a preencher o papel de ordem de saída, mas depois parou. E ela, a menina, insistiu, perguntando se afinal não ia sair da sala. A professora não lhe respondeu, continuando a dar aula. Entretanto uma colega disse-lhe que o papel da participação de saída estava no caixote do lixo e ela foi lá ver: estava mesmo. E a professora continuava sem lhe responder. Então a menina chateou-se a disse: «A setora está-me a dar desprezo!». E saiu da sala.

E veio queixar-se a mim que a professora de matemática lhe tinha dado desprezo! Lá lhe fiz ver que a professora estava a dar a aula e que não podia estar a perder tempo com outras coisas. Que a professora até lhe tinha dado a oportunidade de ficar na aula sem repreensão, e ela afinal só incomodara mais. No fim da conversa, ela achou que era melhor ir pedir desculpa à professora.

E eu fiquei a pensar que estes miúdos têm um umbigo desmesurado.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Mimados e enfadados



A minha ideia inicial de blogue era contar aqui as coisas simpáticas e boas que acontecem numa escola. Julgava eu que seria capaz de dar uma visão positiva dessa tarefa social tão desprezada que é a do professor. Mas ia enganada.

Ensinar hoje é tão difícil. Os alunos são hipercaprichosos, estão sempre a queixar-se, não querem fazer nada, tudo é muito trabalho para eles e tudo é uma chatice, mesmo quando a matéria é banda desenhada (em Língua Portuguesa).

Lá consegui fazer, com o 7º ano, um jornal de turma muito simples. A ideia de início entusiasmou-os; mas depois já não querem, depois amuam, depois batem-se, depois refilam porque o colega é que está no computador, etc. Não conhecem o respeito pelos outros.

São os filhos da abundância, do mimo, das famílias ausentes ou sem referentes. Têm tudo: basta ver pelos telemóveis. Não querem nada, nem sequer sonham com uma qualquer profissão. Mas o seu mundo de fantasias é povoado de violências assustadoras.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

De Maquiavel a Kafka (2)



Antes da nova lei 3/2008, os alunos com Necessidades Educativas Especiais tinham direito a apoio dos serviços de psicologia e os que tinham dificuldades de aprendizagem tinham apoios educativos ou tutorias dados por professores com horas a isso destinadas.

Agora, as condições para obtenção de apoios de psicologia estão muito mais limitadas; e os apoios normais devem ser dados pelo próprio professor do aluno, e "de preferência dentro da sala de aula". Ora, se já é difícil fazer pedagogia diferenciada (nos tempos actuais mais do que nunca), pode bem perceber-se a impossibilidade que é dar apoio individual dentro das aulas colectivas.

E sendo o próprio professor o único incumbido de remediar os males, lacunas, atrasos e dificuldades de todo o tipo (que são muitas) dos seus alunos (que são muitos), nenhum professor deseja sobrecarregar-se de horas extraordinárias... para se tornar vítima do seu próprio zelo.

No entanto, a lei actual determina que os alunos com dificuldades detectadas sejam sujeitos a Planos individuais de Acompanhamento ou de Recuperação. Mas, afinal eles são todos tão fracos que seria impraticável apoiá-los a todos. Então o que podem os professores fazer?

Se realmente eles têm dificuldade, faz-se como a lei obriga: apoia-se mesmo dentro da aula. Portanto, baixa-se o nível. E se os alunos foram apoiados, então, devem passar, porque evoluíram o mais que podiam. Se o professor não declarou que um aluno precisava de apoio, então não pode retê-lo (chumbá-lo). Assim no fim do ano passam todos.

Os que são bons alunos, os coitados, também deveriam ter apoios educativos para compensar o baixo nível de exigência e desenvolvimento cognitivo que é pedido à maioria. A falácia da pedagogia diferenciada e a hipocrisia dos apoios educativos serve, afinal, apenas para promover a passagem automática. E tudo isto resulta na nulidade do valor do ensino.

Mas, como já várias vozes vêm dizendo, pretende-se muito mais do que boas estatísticas. Pretende-se minar o ensino público, para abrir ao privado as auto-estradas da educação.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

De Maquiavel a Kafka (1)



Hoje, graças à benfazeja greve da função pública, que mobilizou todos os funcionários auxiliares e administrativos e impediu que houvesse aulas, pude estar 9 horas seguidas na escola a adiantar o trabalho atrasado. Eu e uma quantidade de professores, mais precisamente os directores de turma, cuja carga de tarefas excede largamente as duas horas semanais que estão reservadas para esta função. «Precisávamos pelo menos de 10 horas por semana», diz-me uma colega.

Nesta fase do ano escolar - pelo mero efeito de acumulação das faltas de dois meses, mas também pelo absentismo crescente dos alunos e pelo agravamento da indisciplina - a quantidade de faltas que cada DT tem que recolher do livro de ponto e registar no sistema informático é de dezenas por dia. Em consequência, os alunos atingem os limites legais de faltas e, nas últimas semanas, os DT não páram de mandar cartas ou telefonar aos pais e EE -"pelo meio mais expedito", diz a lei 3/2008 - para os fazer vir à escola tomar conhecimento da situação do seu educando. Quando eles não respondem ou não vêm, o DT deve sinalizar a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens, o que acaba por ser o argumento final para os fazer vir à escola e prometerem que vão falar com os filhos e que eles não faltam mais, etc., etc.

Pobres pais. É que os filhos são indomáveis e continuam a portar-se mal: ou faltam ou levam faltas disciplinares. Chegámos então à semana em que começa a cair o prazo para os primeiros alunos que serão obrigados a fazer a Prova de Recuperação. Nos livros de ponto inseriu-se mais um anexo, onde o DT assinala a data em que o aluno excedeu o limite de faltas injustificas (3 vezes os tempos lectivos de cada disciplina) e os professores de cada disciplina têm 10 dias para marcar a data prova de recuperação desse aluno, após o que o aluno tem 10 dias para estudar a matéria a que não assistiu. Isto começa a acontecer, neste momento, nas disciplinas com menor carga horária, como História ou Educação Visual.

O pior é que, como os miúdos não vêm às aulas, não é possível avisar os EE simplesmente através da caderneta. Então o professor comunica a situação ao DT e este envia um aviso - por carta registada - ao EE. Mas isto não é um ou dois casos por turma. É um ou dois casos por dia, sucessivamente. O DT não pára de fazer papelada, registos, envios, telefonemas, contactos, etc. Estão agora a perceber por que se queixam os professores de burocracia? Era precisa uma pessoa a tempo inteiro para dar conta, digamos, de 3 turmas problemáticas.

Esta foi a parte kafkiana. Passemos agora ao maquiavelismo.

A história continua assim: o aluno foi avisado e a prova marcada. Se ele comparece e é aprovado, todas as anteriores faltas são consideradas justificadas. O contador volta a zeros. E ele aprende que pode continuar a faltar e que lhe basta fazer uma prova de vez em quando. O DT continuará a assinalar as faltas e a comunicá-las ao EE. Quando atingir de novo o limite de faltas, voltamos ao princípio da história: novas provas de recuperação. E os professores continuam a marcar, fazer, dar e avaliar provas destas aos piores alunos.

O sistema funciona na perfeição. Impede-se assim que o aluno - mesmo penalizado - saia do sistema. Todas as suas tentativas de abandono escolar sairão fracassadas. A prova de recuperação não passa afinal de uma impostura burocrática para impedir que os alunos chumbem.

Mas se o aluno reprova na prova, o Conselho de Turma deve reunir-se e decidir o que fazer com aquele caso. O CT decide então que o aluno tenha um Plano de Acompanhamento Especial e repita a prova ou que seja retido no final do ano (ou excluído no caso se já não se encontrar fora da idade da escolaridade obrigatória). Digamos que o professor de cada disciplina pondera a situação e considera que mais vale passar o aluno do que obrigar uma dúzia de colegas a reunir-se fora das horas de trabalho para decidir do promissor futuro destes jovens.

Uma professora disse-me ontem: «Aviso-te que só faço esta primeira prova. E vou deixar de marcar faltas de atraso». Assim, os alunos começarão a chegar cada vez mais atrasados. Outros professores evitarão as faltas disciplinares. Pois a única hipótese que têm os professores - para escapar ao vício destes procedimentos - é evitar que os alunos tenham demasiadas faltas, ou protelar a inevitabilidade desse momento e depois dar-lhes uma prova "para passar". Na melhor das hipóteses, o aluno falta à prova e automaticamente ficará retido no final do ano.

Entretanto gasta-se tempo a tratar destes cancros, em vez de nos dedicarmos aos que querem aprender. A indisciplina na aula alastra com a impunidade das sanções (a começar pela marcação de falta) e ensinar torna-se muito difícil, senão impossível.

Ontem - na aula de Formação Cívica, onde se tratavam os "direitos dos alunos" - avisei a minha turma de 7º ano: «Digam aos vossos pais que vocês não estão a ter direito a uma educação de qualidade, e digam-lhes que se reúnam para discutirem por que é que a indisciplina de uns impede o direito à educação de outros». Acho que perceberam mais ou menos.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Ministra mente



Quem ouviu hoje a entrevista da ministra (na RTP1) pôde bem avaliar a sua tenacidade, a sua demagogia de sucesso, a capacidade para dar a volta aos argumentos. Mas há mentiras subtis que só servem - mais uma vez e sempre - para fazer dos professores autênticos bodes expiatórios. Há coisas mínimas que qualquer cérebro regista definitivamente.

Qual foi essa mentira? Só quem é professor a sabe. A ministra disse que até agora qualquer pessoa entrava na carreira de professor sem passar por nenhuma avaliação. Disse-o, com estas ou outras palavras, na entrevista que pode ser revista aqui. Falso. É absolutamente falso.

Para se ser professor sempre foi preciso fazer estágio e ser avaliado, inclusive com aulas assistidas. Hoje todos os professores são profissionalizados. Talvez há 20 anos ainda não o fossem, pois havia carência deles. Hoje muitos profissionalizados estão desempregados. Todos entraram na carreira depois de avaliados em funções pedagógicas.

Apesar de todas as outras "inverdades" que a ministra proferiu, nunca ouvi mentira mais demagógica e injusta. E até a deputada do Bloco de Esquerda, com a intenção de rebater os clichés, os reforçou - quando disse que é errado pensar que os professores não fazem nada. Mas não é errado, é falso. E é improdutivo repeti-lo, porque o que fica na ideia das pessoas é apenas uma atenuante da ideia central que permanece: a de que os professores não fazem nada...

É por estas e por outras que os alunos já não acreditam em nós e nos tratam abaixo de cão. Aguentamos com as culpas de toda a sociedade e somos os bombos da festa dos filhos de todas as "famílias" deste país. Triste vida.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Os suplentes



Ontem contaram-me o caso de um professor de filosofia da escola, que entretanto já se reformou. Recusou-se sempre a dar as aulas de substituição, fazia questão de não ceder. Percebe-se porquê: isso afectava a sua dignidade de professor. Para quem toda a vida preparou as aulas para ensinar com objectivos, fazer uma substituição de improviso e sem conhecer os alunos é exactamente a negação da sua profissão; o opróbrio da sua função pública. Por essa razão teve problemas e ficou mal visto no final de longa carreira.

Agora, passados apenas 3 anos, estamos a colher os frutos de se ter confundido o professor que ensina com o animador que entretem e, sobretudo, que impede os alunos de sair da sala de aula. Mas agora quem está preso na jaula são os professores. Ainda ontem, um professor "novato", isto é, recém-regressado à escola, estava irritadíssimo, porque mandou sair um aluno e ele se recusou. Os que lá estão há mais tempo já se habituaram e baixaram os braços; já desistiram de ensinar. Tal e qual.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Os ovos


Afinal - com a benesse dos ovos partidos - talvez a ministra tenha começado a perceber o que a espera da parte dos seus queridos alunos - e o que se passa no ambiente tumultuoso das escolas. A sublevação dos ovos é só um epifenómeno da indisciplina que acontece em muitas escolas. Sintoma da doença de falta de autoridade que afecta a geração mais nova. Na minha escola, ainda ontem, mais uma professora - em aula de substituição - foi mandada "para o caralho" por um aluno do 6º ano. A ira de uns e de outros é perfeitamente equivalente e descontrolada.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Redacção

*

O mote era «as profissões que gostaria de ter». Mas grande parte dos alunos do 7º ano nunca tinha pensado nisso... A alguns sugeri então que escrevessem sobre as profissões que não gostariam de ter.

«Não gostaria de ser professora, empregada de mesa, varredora de rua, empregada doméstica e etc. Porque ser professora é muito difícil, como empregada de mesa tenho que fazer tudo o que me mandam, isso não, como varredora de rua tenho salário muito baixo e tenho que varrer, muito complicado, como empregada tenho que limpar a casa, cozinhar e cumprir regras. Essas profissões são muito complicadas para mim.»

*Foto do blogue Lisboa SOS

domingo, 16 de novembro de 2008

Basta!

*

A manifestação de 10000 professores ontem cumpriu os objectivos de "demonstrar à ministra que os professores estão dispostos a lutar até ao fim" e aos encarregados de educação que "a razão está do lado dos professores". in http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1350125
*Foto do blogue Fliscorno.

Aplicação obrigatória da curva de Gauss


«Nas avaliações do 1º período, vou seguir o exemplo da Ministra (...) da educação,vou estabelecer quotas nas notas já do primeiro período. Assim: 5% para o Excelente e 10% para o Satisfaz Bastante. Se no resto da turma tiver mais alunos com avaliações destes níveis, paciência, ficam com Satisfaz. Assim promovo o mérito dos alunos. Se os pais se sentirem revoltados que se queixem à ministra. Se é bom estabelecer quotas para os professores, deve ser excelente para os alunos. »

Recebido por email. Texto de João Paulo Silva in Público online, sem data, que já circula nos blogues desde há dois anos.

sábado, 15 de novembro de 2008

40 horas (2)



Esta semana trabalhei 40 horas na escola.
Na semana passada, 40 horas no todo.
Continuo com tarefas burocráticas atrasadas 15 dias.
E não tenho tempo para preparar as aulas nem ver os trabalhos dos alunos.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

A sublevação



Hoje de manhã quando cheguei à escola, estava uma carrinha de polícias espalhados pelo largo e um magote de alunos do lado de fora dos portões. Perguntei o que acontecia. É a greve dos alunos, respondeu-me um agente. Afinal, fiquei a saber mais tarde, a polícia apareceu porque havia um grupo de alunos preparados para atirar com pedras da calçada...

A greve foi convocada por sms, sem qualquer pré-aviso público na escola, pelo que nem sequer é válida. Na turma de 7º ano, faltaram 25%; na turma de 10º só não faltaram 30%. Em qualquer dos casos, estiveram excitadíssimos e difíceis de aturar. Talvez tenham ficado desiludidos que eu desse aula.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

A ameaça



Hoje um aluno do 10º do curso profissional começou a fazer ruídos altos com o leitor de mp3; não sabendo bem de onde vinha o som, avisei duas ou três vezes para pararem; depois percebi de que aparelho vinham e aproximei-me do aluno, que entretanto colocara já os auriculares nas orelhas. Pedi-lhe o aparelho (que é proibido por lei). Ele tirou o auricular e disse que não dava; eu insisti: «Dá-me o aparelho». Negou-se. Avisei que se não me obedecia teria falta disciplinar. Negou de novo. Afastei-me e fui para a minha mesa anotar a falta. Ele comenta, a meia voz, do seu lugar: «Não me chateies». Pergunto o que é que ele disse e ele repete a resposta alto. Respondo: “Não falas assim comigo. Não vais ter só FD, vais ter pior”. «Não estou para te aturar», responde. «Não se tratam os professores por tu. Vais ter repreensão registada». Levanta-se irritado e vai a sair da sala, quando profere ainda seguinte ameaça: «Vais ver o que te acontece».

Depois desta ameaça, espero que tenha um processo disciplinar.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

A bizarria



Na origem da confusão sobre a função docente - e sobre isso os professores são unânimes - está a idiotice das «áreas curriculares não disciplinares» (6 horas semanais no 3º ciclo).

A Área de Projecto - destinada a trabalho de grupo sobre temas de interesse dos alunos - é contraproducente; pretendendo promover a autonomia, a cooperação e a responsabilização dos alunos, faz exactamente o contrário; não se pode andar a fazer pesquisa só pela pesquisa; o trabalho de grupo é útil, mas aplicada dentro das disciplinas com objectivos de aprendizagem definidos.

O Estudo Acompanhado, tornado tempo curricular obrigatória para todos os alunos, impede o cumprimento dos seus objectivos específicos que são, segundo o despacho nº 19308/2008 que regulamenta o dec.-lei 6/2001:

«5 - O tempo atribuído ao Estudo Acompanhado deve ser utilizado parcialmente pelas escolas para apoio aos projectos em curso, designadamente:
a) Desenvolvimento do Plano de Matemática;
b) Apoio aos alunos com Português Língua não materna;
c) Realização de actividades no âmbito dos planos de recuperação e de acompanhamento dos alunos;
d) Programas definidos a nível de escola.
7 – Tendo em conta a diversidade de experiências vividas nas escolas e atendendo à sua importância para a promoção da melhoria das aprendizagens, a área de estudo acompanhado pode integrar, entre outras, as seguintes modalidades:
a) Desenvolvimento de planos individuais de trabalho e estratégias de pedagogia diferenciada de modo a estimular alunos com diferentes capacidades;
b) Programas de tutoria para apoio a estratégias de estudo, orientação e aconselhamento do aluno;
c) Actividades de compensação e de recuperação;
d) Actividades de ensino específico da língua portuguesa para alunos oriundos de países estrangeiros.»

Obviamente, nada disto pode ser realizado numa aula com 24 ou mais alunos. Não é possível fazer a almejada "pedagogia diferenciada" no meio do caos. E depois não restam horas disponíveis para os planos de recuperação individuais.

A Formação Cívica é a única não-disciplina que define genericamente, para o 2º e 3º ciclos, alguns conteúdos. Mas não os distribui pelos 5 anos de escolaridade ou por níveis de progressão. Resultado: repetem-se os conteúdos, que são dados aleatoriamente, como quem baralha e volta a dar as mesmas cartas. Assim se descredibiliza a necessidade e pertinência dessas aprendizagens.

Para cúmulo de tudo isto, as aulas de substituição são a causa mais directa do desrespeito dos alunos pela autoridade científica dos professores.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

A guerra (2)



«Estamos em guerra». Esta expressão já a ouvi recentemente a alguns professores. Não estamos em guerra só com a Ministra e o seu espírito persecutório. Estamos em guerra todos os dias dentro da escola. Todos os professores o sentem, mas a situação agrava-se. O número de participações e processos disciplinares em poucas semanas de aulas raia a loucura.

Hoje estive num forum sobre indisciplina na minha escola. Os professores presentes discutiram e propuseram medidas imediatas:

- os conflitos disciplinares devem ser tratados FORA da sala de aula, pelo recurso aos instrumentos e sanções legais (ao contrário daquilo que tem sido uma instrução recorrente: a de resolver os conflitos dentro da sala de aula);

- pois os conflitos mantidos dentro da sala de aula impedem a aprendizagem dos outros alunos; o ensino degrada-se a olhos vistos e os que querem aprender não conseguem;

- os professores devem actuar concertadamente (mas só quando os problemas se avolumaram até ao ponto de ruptura, se começou a debater o problema);

- é preciso que as medidas correctivas e sancionatórias sejam eficazes e aplicadas imediata e coerentemente;

- é preciso participar e aplicar a "repreensão registada" sempre que haja comportamentos agressivos (a repreensão registada fica no processo do aluno e é agravante para os comportamentos sequentes);

- o desrespeito ou desobediência aos professores deve ser imediatamente sancionado (ainda ontem, num conselho de turma, houve quem dissesse que não mandava os alunos sair da aula, porque eles depois se recusam a sair);

- os pais devem ser mobilizados e responsabilizados para resolver os problemas com os seus filhos;

- será preciso criar turmas de nível, para que a maior parte dos alunos possam ter uma escolaridade normal e eficaz; só assim a escola pública voltará a ter a qualidade e a credibilidade que antes tinha.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Diálogo



«- Boa tarde, aqui fala a DT da sua filha, como está? Ligo-lhe porque a sua filha está a faltar muito às aulas, e esta semana mandei-lhe outra carta, mas achei melhor avisá-la já... E tenho recebido muitas participações dos professores...
- Pois, já sei o que se passou com a professora de matemática e vou averiguar...
- Eu não sei o que se passou...
- A professora chegou atrasada e ainda por cima mandou a minha filha embora antes sequer da aula começar, marcou-lhe falta disciplinar.
- Assiste-lhe esse direito, o professor pode marcar falta se o aluno está a perturbar.
- Mas a minha filha não foi a única a atirar-se para o chão, todos se atiraram. Ela é que não sabe controlar à aula.
- Pois, não sei o que aconteceu, terei que falar com a professora, mas não tenho aqui nenhuma falta disciplinar marcada.
- É que ela chega tarde e estão os alunos à espera...
- Os professores podem atrasar-se e os alunos esperam. Os professores estão com muito trabalho e às vezes não conseguem chegar a tempo à aula.
- Mas mandou-a para o PME e escreveu no papel que era porque lhe apetecia. Eu vou averiguar isso.
- Sabe que o professor não precisa de justificar por que manda o aluno para o PME, justifica apenas mais tarde, senão perdia muito tempo da aula.
- Já vi que está a querer confrontar-me.
- Não, não, eu estou preocupada com a sua filha e é por isso que lhe telefono.
- Pois, já vi que não é à toa que dizem que os professores agridem os alunos.
- Bom, nesta escola parece-me que é mais o contrário.
- Eu vou averiguar isto e vou directamente ao Conselho.
- Acho muito bem, pode ir onde quiser, mas eu estou cá para a ajudar. Falarei com a professora.
- Eu acredito na minha filha.
- Claro, mas é preciso ouvir a versão da professora para saber o que aconteceu.
- A minha filha não mente.
- Bem, então nesse caso, será que ela lhe contou que faltou a 14 aulas na semana passada?
- Omitiu, só.
- Então, pergunte-lhe hoje a quantas aulas faltou, para ver se ela lhe diz a verdade.
- Eu sei que a minha filha não é santa...
- Pois não, mas sabe onde é que ela vai quando falta? Eu não sei, mas para algum sítio vai. E tenho-a visto às vezes com algumas más companhias...
- Pois, sim, na sexta-feira vou falar consigo, obrigada.»

Amanhã verei como se comporta a menina...

sábado, 8 de novembro de 2008

Vivam os professores, morra a ministra, pum



8 de Novembro, 120 mil professores em Lisboa.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

A tenda do sexo



«Ó Setora, vamos à tenda do sexo!». A tenda estava instalada no jardim. Uma colega apressada passa por mim e sugere que leve a minha turma, pois sim, marquei logo uma hora para daí a dois dias. «Agora tenho que ir, desculpa, estou com pressa, tenho que tratar de uma aluna de 12 anos grávida...»

E lá os levei à tenda, onde, em 20 minutos de jogos dinâmicos e concursos de respostas, 6 monitores conseguiram passar a 24 miúdos várias mensagem fundamentais: onde fica, qual o horário, e tudo o mais sobre a Unidade de Saúde W Jovem da Santa Casa da Misericórdia. Muito eficaz. Das 8 às 20 horas. Dos 12 anos aos 24 anos: enfermagem, consultas ginecológicas, psicologia, etc.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

A depressão



Aos poucos tenho vindo a perceber algo que me pasmava desde início do ano: os meus colegas tão calmos e eu sempre a passar o limiar da irritação, quando não do desespero. Enfim, pela primeira vez na vida, decidi tomar um ansiolítico antes de ir para a escola. Foi bom, agora já não perco a têmpera. Mas a inutilidade de tanto esforço deprime inevitavelmente. Estou a considerar tomar o antidepressivo que a médica me receitou. Tenho falado com muitos colegas, todos eles andam a comprimidos (todos andam deprimidos). Mas receio, então, ficar tão imune aos problemas que deixe de os saber confrontar. Um pouco de indignação seria necessária, penso, mas percebo que os professores chegaram já ao ponto em que nada mais suportam. Diz-me uma colega experiente: «És tu ou eles. Tens que sobreviver». E os problemas continuam, mas quem os resolverá?

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Os ineducáveis



A sala dos DT é um sítio de conversas telefónicas (aos EE) interceptadas involuntariamente, além de desabafos e novidades. Soube que um miúdo do 7º ano mandou uma professora a qualquer coisa com a letra p... A directora de turma estava de cabelos em pé e contava: «Perguntei à colega o que é que ela tinha feito, e ela diz-me que esteve a conversar com eles, se eles achavam que isso era boa educação, mas eles começaram logo a acusá-la de estar a dizer que os pais não os educavam bem...» «Deve andar cheia de valiums», concluiu.

Dantes dizia-se que o bom professor era missionário, o que era um exagero; um bom professor só tem que se esforçar até onde pode. Hoje, educar parece ser uma missão impossível.

P.S. Suspensão de cinco dias decidida, mas como não foi imediatamente aplicada, já mandou outra professora à mesma letra...

terça-feira, 4 de novembro de 2008

40 horas



Diz a imprensa: Muitos professores trabalham mais de 40 horas semanais. A semana passada também trabalhei 40 horas, 33 na escola, o restante em casa.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

As criaturas


No conselho de turma do 7º ano, o delegado de turma apresentou algumas queixas em relação aos professores: uma delas é que uma professora os "insultava" de "criaturas" ao mesmo tempo que os chamava de "queridos" e isso - reclamava uma menina na Assembleia de Turma que precedeu a reunião - isso ela "não admitia". Sorri. Tinha imensa graça. Lá lhes expliquei que criaturas não é um insulto, chega a ser uma palavra carinhosa, e que dantes se ouvia dizer na expressão mais completa "criaturas de Deus". O que me espanta é o fosso cultural, linguístico, relacional entre - apenas - uma geração de diferença. É como se estes miúdos, possivelmente educados pela televisão, pela playstation e pela creche, tivessem sido deserdados de toda a memória familiar. E para nós, professores, começam a tornar-se verdadeiros aliens.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

O 112



Para terminar a semana em glória, tive um aluno de 19 anos do curso profissional que resolveu implicar comigo e falar alto e interromper e mandar bocas sucessivamente. Depois que alguns avisos, disse-lhe que fosse lá para fora fazer o exercício para não incomodar a aula. Instado várias vezes e com bons modos, ele lá se decidiu a ir, sem deixar de continuar a falar alto e a dar show enquanto demoradamente arrumava as suas coisas. Obviamente, quando saiu, marquei-lhe falta disciplinar.

A seguir, houve outro aluno que amuou quando lhe perguntei onde estava a ficha distribuída e que ele metera no bolso de trás das calças, e a quem marquei falta de material por não ter papel nem caneta na aula. Amuou, logo saiu, logo teve falta de presença. Esse foi contar ao outro que eu lhe marcara FD. E pela janela vejo-os aproximarem-se a passo rápido.

A porta estava aberta e eu disse ao primeiro que não podia entrar. Começou aos gritos: que eu não podia mandá-lo embora, que não admitia isso, queria exigia uma explicação, etc. Respondi com calma, não dei explicações porque obviamente não tinha que dar. O aluno vociferava perto de mim, entrou - avançando sobre o espaço onde eu lhe barrava a entrada - e sentou-se. A atitude era intimidatória. Eu liguei para o 112, pedi a "Escola Segura" porque um aluno se recusava sair da aula. Depois pedi à delegada de turma para chamar a auxiliar a quem pedi para avisar o conselho executivo. E veio o Presidente do CE à sala. O aluno barafustou, contou os factos e as queixas, dizendo que eu fora injusta. Quando se calou, o Professor apenas respondeu: «A Senhora Professora deu-te uma ordem, tens que a cumprir. Se queres participar não é aqui que o fazes, falas com o teu director de turma». Fê-lo parecer mal de tal modo que, quando saiu da sala, já pedia desculpa aos colegas. Quando a aula acabou pouco depois, cá fora estava o Presidente a conversar com dois polícias.

O Professor disse-me que deveria primeiro tê-lo chamado a ele, não à polícia. Talvez, mas nunca tal me tinha acontecido (e por motivos irrisórios); uma pessoa assustada e com a cabeça quente não age muito racionalmente. A verdade, porém, é que se o Professor do CE tivesse chegado à aula e o aluno continuasse a recusar-se a sair, a sua desobediência não seria maior do que aquela que teve para comigo. E ele teria que chamar a polícia. Qualquer professor é um professor e a sua autoridade vale o mesmo que a dos colegas. A desobediência a um professor é uma falta grave. Se o aluno não acata a sua autoridade, é preciso chamar uma autoridade maior: as forças da ordem.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O respeitinho (2)



Às vezes custa a acreditar. Ainda há poucos anos, os professores e as professoras (a maioria feminina do corpo docente) eram vistos como pessoas amigas, conselheiras e sapientes, pelas quais havia um dado respeito, tácito e adquirido. Sempre fora assim. Hoje, os alunos vêem o professor como um inimigo, sistematicamente questionam o seu saber, as suas atitudes e indicações, e confrontam-no directamente. Não estou sequer a falar dos alunos crescidos, cujo discernimento poderia atingir os professores menos bons, que os há sempre (e todos os tivemos). Estou mesmo a falar daqueles seres inconscientes que do alto dos seus 12 ou 13 anos dizem diante dos professores aquilo que provavelmente ouvem dizer em casa.

Contava ontem uma professora já com longa carreira: «Hoje tive que dizer a um aluno o que nunca tinha dito antes: nós não somos iguais, eu sou professora, tu és aluno». No mesmo dia, tinha eu dito o mesmo à minha turma, quando se queixavam de que os professores podiam usar telemóvel na aula. E disse mais: «Vocês podem até não gostar de um professor, mas uma coisa é certa: da matéria que ele ensina, ele sabe muito e só ele pode ensinar, porque estudou e tirou um curso». Não sei se perceberam.

Quando é que isto começou? Ora, aí ninguém tem a menor dúvida. Foi quando a senhora ministra que nos governa denegriu, desautorizou e insultou a classe docente.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Mens sana in corpore sano



Em vez de 6 tempos lectivos semanais (6 x 45 minutos) de "áreas curriculares não disciplinares" (que são Área de Projecto, Estudo Acompanhado, Formação Cívica e Assembleia de Turma) cuja falta de programa definido apenas promove, como a fatalidade da sua designação indica, a não-disciplina - muito melhor seria que os miúdos do 3º ciclo tivessem todos os dias Educação Física, que é melhor forma de usar o excesso de energia, de promover o espírito de equipa, a cooperação, a responsabilidade, o cumprimento de regras, o respeito pelos outros, o conhecimento do corpo humano, além de contribuir para a saúde, combater a obesidade, a depressão juvenil, as revoltas gratuitas, etc. Actualmente, os alunos têm apenas 3 tempos de ginástica (1 x 90 min. + 1 x 45 min.). Se isso bastasse, não andavam nos corredores a correr e a bater-se, nem criariam tantos distúrbios dentro das aulas.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

A sanha da organização



Dantes a burocracia de uma escola concentrava-se na secretaria, para além naturalmente dos cadernos diários dos alunos e dos apontamentos e exercícios elaborados pelos professores. Depois veio uma ministra que decidiu organizar a escola segundo um conjunto complexo de regras, obrigações, relatórios, estatísticas, etc. A mania da organização apoderou-se então do espírito de alguns professores sistemáticos que começaram a traduzir, em cada escola, a carga de instruções em tabelas, esquemas, normas e papeladas infindáveis, que - por força da sua existência - são impingidos aos professores intuitivos e se tornam norma interna.

Assim, na minha escola, aquilo que se designa por avaliação qualitativa foi literalmente transformado em quantidades. Por exemplo: na avaliação intercalar diagnóstica do 1º período, há 4 parâmetros de avaliação: a) conhecimentos e competências; b) participação na aula; c) atitudes e valores; e d) TPC. A cada um destes aspectos, cada professor atribui NS (não satisfaz), S (satisfaz) ou SB (satisfaz bem) para cada aluno. Depois, segundo uma tabela abstrusa com 81 arranjos possíveis, faz-se a média destas qualidades para atribuir uma qualidade global. Isto é a perversão total do que seja uma avaliação qualitativa. Mas dá jeito para fazer estatísticas.

O excesso de organização, trâmites e regras arbitrárias redunda em desorganização completa. Os professores são obrigados a navegar num mar de regras que conhecem mal e que perderam qualquer relação ao real: à escola e aos alunos.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

A medida correctiva



Depois da facada no ombro do colega, cujo autor foi imediatamente transferido de escola, a moda pegou e outro miúdo apareceu na aula ameaçando com uma faca de cozinha. Como "medida correctiva" foi obrigado a cumprir já não sei que tarefa social, tipo limpar o chão do pátio ou parecido. Então - provavelmente insatisfeito com os resultados da sua acção - o culpado obrigou um miúdo mais pequeno a fazer essa tarefa, sob ameaça de levar uma facada. Agora, sim, corre o processo disciplinar que, evidentemente, devia ter sido imediato.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Desobediência (2)



Já há escolas - e professores, individualmente - que começam a desobedecer ao absurdo modelo de avaliação imposto pelo ME:

«Na Escola Secundária Camilo Castelo Branco, Vila Real, 130 dos 160 professores decidiram mesmo suspender o processo de avaliação, não entregando os objectivos individuais.
Na moção aprovada, os professores daquele estabelecimento de ensino referem que os objectivos de todos os docentes estão definidos e passam, indiscutivelmente, pelo sucesso dos seus alunos, segundo a professora Delfina Rodrigues, em declarações à agência Lusa.»

in http://horariosescolares.blogs.sapo.pt/68847.html