terça-feira, 20 de janeiro de 2009

O Processo (2)



Faltou à primeira audição. Enviei nova convocatória por correio registado. Telefonei duas horas antes a saber se ia estar presente (não queria perder o meu tempo). Chegou com 10 minutos de atraso. Entrou no edifício (um anexo da escola) a chamar "Ó da casa!" Tomei o meu tempo, saí pelo corredor estreito, perguntei o que queria, identifiquei-o, identifiquei-me e disse-lhe que esperasse um pouco, apontando para duas cadeiras no átrio. Regressei à sala onde, por acaso, estava a DT, que mais uma vez me avisou: "Ele é impossível, muito bruto, tem cuidado". Fi-lo esperar um pouco. Nem dois minutos passaram, já devia espumar de impaciência e gritava "Ó s'tora!" e qualquer coisa que nem percebi. Tomei o meu tempo, dei a volta pela sala anexa e abri outra porta que dá para átrio. "Entre".

Com a maior das neutralidades, disse-lhe "Sente-se". Expliquei-lhe - qual funcionária da Loja do Cidadão - que iria ouvi-lo por causa do ocorrido da aula tal de dia tal da professora tal, e que no fim lhe pediria para assinar o depoimento. Pareceu mais calmo. Li-lhe então os factos de que era acusado, resumidos a 4 pontos. Ouviu atentamente e respondeu logo, ponto por ponto, sem falhas. Negou que tivesse dito palavrões na aula, só lá fora, alegando que não foram dirigidos à professora; só hesitou quanto às ameaças que fizera à professora, dizendo que não se lembrava, mas "era capaz"...

Em seguida dei-lhe a participação a ler. Negou de novo que tivesse dito os palavrões que lá estavam entre aspas. Chamou cínica à professora, por ela ter escrito que sempre o tentara ajudar e o tratara com respeito. Queixou-se então de ser injustiçado, porque a professora tinha preferências e deixava os colegas ouvir música com auriculares e a ele não. Perguntei-lhe se não achava que a professora também se sentira injustiçada. Não respondeu. Insisti: "É assim que trata a sua mãe?" (Já tinha a pergunta preparada de antemão.) Ele ia a responder que sim, mas reformulei logo a pergunta: "Gostava que tratassem assim a sua mãe?" Não respondeu. Não mostrou arrependimento.

Disse-lhe que teria que esperar um quarto de hora para eu poder passar as notas para o computador. Ele anuiu um pouco contrariado e impaciente. Quando voltou, leu em silêncio a minha acta e assinou, sem reparos, tudo o que antes dissera. Maior de idade.

Como já tinha ouvido dois alunos enquanto testemunhas da ocorrência, eu sabia que ele estava a mentir. (Enfim, tecnicamente falando, já que não me passaria pela cabeça duvidar da verdade das queixas da professora.) As testemunhas só não confirmaram as ameaças que ele admitiu. O seu "currículo" escolar é uma colecção de actos agravantes. Nenhuma atenuante encontrei, nem a mínima intenção de mudar de comportamento. Propus 10 dias de suspensão (pena máxima), considerando que insultar um professor é de gravidade máxima e que ameaçar é um acto passível de procedimento criminal; e visto que a transferência é só para casos em que está em perigo a tranquilidade ou segurança da escola.

Foi uma semana atrapalhada, em que não me sobrou tempo para mais nada. Mas achei graça a fazer de "inspectora".

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