terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Passagem de nível



Esta semana surgiu o debate em torno de soluções para o ensino: a criação de turmas de nível é, acho, a proposta mais sensata para resolver o problema das dificuldades de aprendizagem:

«Misturar na mesma turma alunos com capacidades e objectivos muito diferentes é prejudicar todos eles e não beneficiar ninguém. Por um lado, os melhores sentem-se completamente desmotivados, o que prejudica a prazo as suas capacidades, impedindo-as de se desenvolverem. Por outro, os que têm mais dificuldades acabam também por se desmotivar porque nem mesmo assim conseguem acompanhar o ritmo dos demais.
Ora, para que alguém aprenda e evolua é necessário que a aprendizagem esteja adequada ao seu nível, ou seja, aos seus conhecimentos, às suas capacidades e às suas competências. Para uma pessoa melhorar o salto em altura, nem se pode pôr a fasquia tão baixa, ao ponto de não exigir qualquer esforço para a ultrapassar, nem tão alta, ao ponto de se ter a certeza, antes do salto, que é impossível consegui-lo.
Este impasse só será ultrapassado com a criação das turmas de nível onde, necessariamente, todos os alunos estão em pé de igualdade, o que gera, só por si, uma concorrência saudável e permite ao professor encontrar as estratégias adequadas. Só que fazer isso implicaria pôr em causa um dos dogmas fundamentais do actual sistema de ensino. E com os dogmas não se brinca. O Galileu que o diga




Aqui todos os problemas vão dar aos outros. As dificuldades de aprendizagem provêm não apenas da heterogeneidade das turmas e de os alunos estarem em níveis cognitivos diferentes, mas também da rejeição liminar que muitos jovens fazem da escola...

Admitamos que, dentro da escolaridade obrigatória, todos devem progredir (ao seu ritmo, claro) sem retenções. Para isso seria necessário, antes de mais: criar turmas de nível, pois é impossível ensinar compassadamente alunos em níveis diferentes de conhecimento.

Por outro lado, também não é possível ensinar quem não quer aprender; mas este é o panorama geral do actual ensino. E por que é que os alunos estão tão desmotivados? Isso é o que mais custa entender. Será porque os pais dizem mal dos professores em casa? É certamente. Para eles a escola não vale nada. Mas não só. Na verdade, eles sabem que não vão “chumbar” e que não têm que se esforçar.

E nem sequer conhecem a recompensa do esforço, por outra razão: porque, na realidade, os professores não conseguem fazer numa turma heterógenea a chamada “pedagogia diferenciada”; ao proporem actividades e exercícios que não são adequadas nem para os mais atrasados nem para os mais avançados, provocam a frustação inevitável a todos os alunos. Como eles já não acreditam muito na escola, e como não conseguem obter satisfação seja qual for o seu “nível” de aprendizagem, distraem-se e tornam-se indisciplinados.

Sem disciplina não é de todo possível aprender. Quando falo de disciplina, estou até simplesmente a pensar num problema simples e maior: o facto de os alunos não saberem organizar o caderno diário, ou não trazerem as fichas que foram distribuídas na aula anterior, porque as acumulam ad-hoc em micas ou porque deitam fora os materiais fornecidos e os trabalhos feitos, como se nada valessem. Por indisciplina entendo também a incapacidade para prestar atenção durante mais de um minuto seguido.

Para mais, a dúzia de disciplinas que têm, várias delas apenas uma vez por semana, não favorece uma aprendizagem continuada e progressiva. Aprendem coisas dispersas e voltam a elas uma semana depois quando na sua curta memória tudo foi esquecido.

As aulas de 90 minutos também em nada ajudam; faz-se hoje muito menos numa aula destas do que se fazia dantes numa de 50 minutos; as crianças são hiperactivas e não aguentam sentadas tanto tempo; mas os intervalos continuam com o mesmíssimo tempo.

O que eles precisavam era de ginástica todos os dias: mens sana in corpore sano. E matemática todos os dias, língua portuguesa todos os dias, e história, geografia, ciências e artes pelo menos dia-sim-dia-não.

A agravar, as áreas-disciplinares-não-curriculares apenas servem para introduzir o imponderável dentro do conceito de aprendizagem e para confundir os alunos sobre a função da escola; ao quererem promover o trabalho de pesquisa sobre assuntos do interesse das crianças fazem-nas crer que tudo o que precisam de saber “está no google” e que o mundo é como a televisão o mostra. Os miúdos não concebem sequer que houve história antes deles.

Ah, esquecia-me ainda do pior: as aulas de substituição, que confundiram de vez os alunos sobre o papel dos professores, que agora são pouco mais que tratadores de jardim zoológico. Como diz Ramiro Marques: «Antes da imposição do sistema das aulas de substituição, havia maior tranquilidade e mais disciplina nas salas de aula».

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